Feminicídios têm queda de 45,5% no RS

Por Gabrielle Pacheco

Após quatro meses de alta ou estabilidade, os assassinatos de mulheres por motivação de gênero no Rio Grande do Sul voltaram a registrar queda. Em maio, houve seis feminicídios no Estado – 45,5% a menos do que os 11 registros no mesmo mês do ano passado. O resultado é verificado após a implantação de uma série de iniciativas pelas instituições vinculadas à Secretaria da Segurança Pública (SSP) para intensificar o combate à violência contra a mulher e reforçar a importância das denúncias, em especial neste momento em que enfrentamos a pandemia da Covid-19.

Em maio, a SSP lançou campanha para ampliar a divulgação dos canais de alertas de violência contra a mulher. O objetivo é incentivar entre mulheres, familiares, amigos, vizinhos e até desconhecidos a realização das denúncias anônimas, que podem fazer a diferença para salvar vidas. Nenhuma das seis vítimas de feminicídio no RS no mês passado tinha qualquer registro de ocorrência anterior contra o agressor – em cinco dos casos, havia relação íntima entre a mulher e o autor do crime.

“A campanha fomenta que não apenas as mulheres vítimas, mas também as pessoas que estão na sua volta, vizinhos, amigos, familiares, que ao tomarem conhecimento de qualquer situação de violência doméstica, assumam o dever moral de comunicar às instituições. É preciso romper o silêncio e denunciar”, disse a major Karine Brum, coordenadora das Patrulhas Maria da Penhas da Brigada Militar.

A campanha “Rompa o Silêncio” é composta por seis cards e dois vídeos, em arquivos pequenos para facilitar o download, disponibilizados em todas as redes sociais da SSP e do Governo do Estado. Os vídeos, criados com foco especial no compartilhamento via WhatsApp, foram propositalmente produzidos sem som. Esse formato possibilita que sejam assistidos a qualquer momento, evitando o constrangimento de mulheres que se sintam de alguma maneira ameaçadas nesse momento de quarentena doméstica em razão da Covid-19. A ausência de áudio ainda instiga a reflexão sobre a urgência de romper o silêncio.

Enquanto na soma dos quatro primeiros meses do ano o WhatsApp da Polícia Civil havia recebido apenas 13 denúncias, com a campanha, só nas últimas duas semanas de maio houve 19 alertas. 

Os casos podem, e devem, ser comunicados pelos seguintes canais:

– Disque Denúncia 181

– WhatsApp (51) 9.8444.0606

– Denúncia Digital 181, no site da SSP (clique aqui)

– Emergências pelo 190

– Disque 180

No início de maio, a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) de Porto Alegre, em parceria com o Instituto-Geral de Perícias (IGP), inaugurou o serviço de plantão psicológico online para vítimas diretas e indiretas de violência doméstica. O atendimento, que tem o objetivo de ouvir a mulher, auxiliar no preenchimento do questionário de avaliação de risco e facilitar sua organização mental para o depoimento, será implantado em todas as 23 DEAMs do Estado até o final deste mês.

Após a recepção na DEAM da Capital, com a anuência da vítima, seu número de telefone é repassado para a psicóloga responsável do Departamento Médico-Legal. Em seguida, em sala reservada ao acolhimento psicossocial, enquanto a vítima aguarda para prestar depoimento, a profissional de saúde faz contato por videochamada para uma conversa que dura de 20 a 25 minutos.

O serviço é realizado na segunda-feira, das 9h às 17h, e no sábado, das 10h às 15h. Para as vítimas que procuram a DEAM entre terça e sexta-feira, é possível combinar um horário para a realização do atendimento remoto.

As 23 Delegacias Especializadas ainda reforçaram o trabalho proativo de prisão de agressores e de busca em locais onde há suspeita da presença de armas e outros instrumentos que possam oferecer risco a vítimas que registraram ocorrências. Só a DEAM da Capital, prendeu 11 suspeitos, recolheu seis armas e cumpriu 51 mandados de busca e apreensão.

Uma ação da Brigada Militar (BM) no último dia de abril também contribuiu para o resultado positivo no mês seguinte. A Operação Jerônyma Mesquita, deflagrada pelas Patrulhas Maria da Penha (PMPs) para intensificar a fiscalização de medidas protetivas de urgência (MPUs), ocorreu de forma simultânea em 62 municípios e efetuou sete prisões, além de 527 visitas a residências de mulheres vítimas. A operação levou o nome da enfermeira que liderou lutas pela garantia de direitos, como o voto, e cujo aniversário foi escolhido para marcar o Dia Nacional da Mulher, em 30 de abril. Em março, as PMPs ampliaram em 82% o número de municípios atendidos no Rio Grande do Sul, de 46 para 84.

Esse conjunto de iniciativas, além da redução de feminicídios, também se refletiu na retração de outros três indicadores de violência contra a mulher no RS em maio, comparado com o mesmo mês de 2019. As ocorrências de ameaças diminuíram 21,3% (de 2.893 para 2.276), as lesões corporais baixaram 19,5% (de 1.499 para 1.207), e os estupros caíram 11,5% (de 104 para 92). A exceção foram as tentativas de feminicídio, que passaram de 31 para 37 (19,4%).

A redução nos assassinatos de mulheres no quinto mês de 2020 contribuiu para frear a tendência de alta verificada no ano. Entre janeiro e maio, a soma de 43 feminicídios é 34,4% maior que os 32 do mesmo período de 2019 – até abril, a alta nesse comparativo era de 71,4%.

Nos outros quatro indicadores, a leitura do acumulado aponta queda. O total de tentativas de feminicídio no RS baixou 13,8%, de 160 entre janeiro e maio do passado para 138 em igual intervalo deste ano. As ameaças caíram 12,6% (de 16.414 para 14.342), as lesões diminuíram 7,3% (de 9.103 para 8.434) e os estupros reduziram 1,4% (de 653 para 644). Ainda assim, o monitoramento não descarta a possibilidade de subnotificação nas situações de menor gravidade (ameaça e lesão), em razão de maior receio pela convivência com os agressores durante o isolamento contra o coronavírus. Por isso, as autoridades reforçam a importância das denúncias.

“São muito raros os casos em que o feminicídio é resultado da primeira agressão. Em geral, as mortes por motivação de gênero são o ponto final de um longo ciclo de violência que, quanto antes for rompido, tem mais chances de preservar as vítimas. Por isso, nesse período de maior recolhimento domiciliar em razão da Covid-19, é ainda mais fundamental que toda e qualquer suspeita seja levada ao conhecimento das forças de segurança, que estão prontas para ajudar”, ressaltou o vice-governador e secretário da Segurança Pública, delegado Ranolfo Vieira Júnior.

Outras duas iniciativas formalizadas na última semana de maio devem auxiliar o trabalho das forças de segurança no combate aos crimes contra as mulheres. A Polícia Civil lançou a Cartilha da Delegacia Online (DOL) para fatos envolvendo violência doméstica. O documento apresenta o passo a passo para que as mulheres vítimas utilizem o padrão simplificado, dentro da DOL, por meio do botão “Registre sua ocorrência”. Este padrão oferece mais segurança para a mulher fazer seu relato sem precisar comparecer a uma delegacia.

No final de maio, o Conselho Nacional de Chefes de Polícia Civil (CONCPC) aprovou seis resoluções que padronizam procedimentos e fomentam boas práticas no atendimento aos crimes de gênero. As medidas foram idealizadas pelo Fórum Permanente de Enfrentamento à Violência contra Mulher, coordenado pela vice-presidente do CONCPC na Região Sul, a delegada Nadine Anflor.

Além de orientar a capacitação continuada dos agentes para atendimento especializado às mulheres vítimas e a criação de grupos reflexivos focados nos autores dos crimes, para evitar a reincidência, as resoluções estabelecem o Protocolo Nacional Integrado para Investigação Criminal das Mortes Violentas de Mulheres com Perspectiva de Gênero (feminicídios). O protocolo será aplicado na apuração de óbitos femininos, de tentativas – incluindo casos de suicídio –, de mortes aparentemente acidentais, do desaparecimento de mulheres e de abortos sem o consentimento da gestante.

“O protocolo será muito importante para aprimorar a investigação na medida em que estabelece como padrão o olhar especializado para todos os crimes em que haja mortes de mulheres. Dessa forma, o primeiro contato em todos os casos desse tipo terá esse cuidado para analisar possíveis características marcantes dos delitos motivados por gênero, só partindo para outras hipóteses por meio da exclusão. Essa atenção vai proporcionar apurações mais robustas e dados melhores para estudarmos e combatermos esses atos criminosos”, explica Nadine.

Ataques a transporte coletivo no RS têm queda de 64,9% em maio

A manutenção integral do trabalho das forças de segurança, aliada à movimentação ainda abaixo do normal nas ruas, resultou em novas quedas expressivas nos crimes patrimoniais no RS em maio. O destaque foi a redução de 64,9% nos roubos a transporte coletivo, somando as ocorrências envolvendo passageiros e motoristas de ônibus e lotações.

O Estado adotou no início de maio o distanciamento controlado, que liberou a retomada parcial de diversos setores. Ainda assim, a redução das ações criminosas contra transporte coletivo foi maior do que a verificada em abril, quando havia mais restrições. No quinto mês de 2020, houve 98 casos, menos da metade dos 279 registrados no mesmo mês de 2019. É o menor total desde que esse tipo de delito passou a ser contabilizado em separado, em 2012. Só a Capital teve redução de 82 ocorrências (-66%), passando de 125 em maio do ano passado para 43 em igual intervalo deste ano.

Na leitura acumulada, a queda nos roubos a passageiros e motoristas de ônibus em todo o Estado chegou a 531 registros a menos – foram 1.070 ocorrências entre janeiro e maio do ano passado contra 539 no mesmo período de 2020 (-49,6%). O total atual representa a menor soma para o intervalo entre o primeiro e o quinto mês de cada ano em toda a série histórica, iniciada em 2012.

Os roubos e furtos a estabelecimentos bancários mantiveram a tendência de queda verificada ao longo de 2019 e que se aprofundou neste ano. Em maio, houve oito ocorrências em todo o Estado, uma queda de 27,3% em relação às 11 registradas no mesmo período do ano anterior. O número atual é o menor total para o mês desde 2017, que teve sete casos.

O resultado no acumulado desde janeiro é mais expressivo. Enquanto em 2019 o Rio Grande do Sul contabilizava 49 ataques a banco até maio, neste ano a soma caiu mais do que a metade, para 23 ocorrências (-53,1%). O dado, além de ser o menor total para o período desde que esse tipo de crime passou a ser tabulado em separado, em 2012, representa também a maior redução percentual de um ano para o outro em toda a série histórica.

A marca reflete em parte a menor circulação nas ruas, embora as agências bancárias sigam com movimento considerável em razão da busca pelo auxílio emergencial, mas também teve influência do trabalho direcionado das forças de segurança para evitar esse tipo de delito. Entre as principais ações, está a Operação Angico, desenvolvida pela Brigada Militar com na análise de dados de inteligência para antecipar e reprimir a ação de criminosos e quadrilhas especializadas em ataques a banco. A ofensiva está estruturada em três estratégias: fiscalização ativa para evitar desvios, furtos e roubos de explosivos; mobilizações focadas em prisões de assaltantes e utilização de efetivo especializado com suporte da inteligência.

Queda geral dos crimes patrimoniais no Estado

Além da ampla retração nos roubos a transporte coletivo e nos ataques a banco, maio também encerrou com queda nos demais delitos que completam a lista dos principais indicadores sobre crimes contra o patrimônio no Rio Grande do Sul. Em todos os casos, apesar da retomada parcial de atividades com a adoção do distanciamento controlado, é perceptível a influência das restrições impostas pela pandemia da Covid-19.

Na comparação com o mesmo mês de 2019, o roubo de veículos teve redução de 21,2%, passando de 905 casos para 713. Entre os furtos de veículos, a baixa foi de 33,4%, com 1.172 ocorrências em maio do ano passado e 781 neste ano.

A diminuição foi ainda mais expressiva nos roubos em geral, com 3 mil registros a menos. Enquanto no quinto mês de 2019 foram contabilizados 6.273 casos, maio passado teve 3.202 roubos,
o que representa uma queda 49%. Entre os furtos, na mesma comparação, a redução foi de 46%, com 5 mil registros a menos – de 10.708 para 5.782. Naturalmente, por se tratar de um crime de menor potencial ofensivo, o monitoramento não descarta a hipótese de subnotificação. Por isso, as autoridades alertam sobre a importância de efetuar os registros, que podem ser realizados sem a necessidade de deslocamento, por meio da Delegacia Online da Polícia Civil (clique aqui).

Latrocínios no RS caem 40% em maio

Com menos crimes patrimoniais, menores as chances de ocorrerem roubos com morte. A baixa nos delitos que visam bens das vítimas também se refletiu na redução de 40% nos latrocínios no RS – foram cinco casos em maio de 2019 e três no mesmo período deste ano. É o menor total para o mês em 18 anos, desde que a SSP deu início à contabilização de crime no Estado, em 2002.

O recorde também se repete na análise dos dados acumulados desde janeiro. A soma de 26 ocorrências é a menor de toda a série histórica e representa queda de 23,5% sobre os 34 registros do mesmo período de 2019.

Em Porto Alegre, o mês de maio encerrou com 24 vítimas de homicídio, uma a mais (4,3%) que as 23 registradas no mesmo intervalo no ano passado. Apesar da alta, o número atual ainda é o segundo menor desde 2010.

Na leitura acumulada, em razão das reduções verificadas desde o início de 2020, o índice permanece em baixa, com queda de 14,8%. Entre janeiro e maio do ano passado, foram 149 vítimas de homicídio na Capital. Em igual período deste ano, a soma foi de 127 óbitos. É o menor total em Porto Alegre para os cinco primeiros meses em 11 anos.

A consolidação dos indicadores criminais de maio confirma a ausência de influência das restrições impostas pela pandemia da Covid-19 sobre as ocorrências de homicídio no RS. Mesmo com a circulação de pessoas ainda abaixo do normal, o mês teve nove vítimas a mais este ano do que em 2019, passado de 145 óbitos para 154 (6,2%).

No acumulado, porém, com as reduções verificadas entre janeiro e março, o indicador segue em baixa. Na comparação entre os cinco primeiros meses de 2019 e de 2020, a queda no número de vítimas de assassinato foi de 6,9%, com 57 mortes a menos – de 827 para 770. É a menor soma para o período desde 2011, quando foram contabilizados 739 óbitos.

Entre os possíveis fatores para os homicídios no RS em maio não terem sofrido o mesmo efeito que as medidas de distanciamento social provocaram nos delitos contra o patrimônio, as autoridades apontam o acirramento das disputas do tráfico pelo encolhimento do mercado. Além da menor circulação de pessoas, que naturalmente reduz o comércio ilegal de entorpecentes, o volume de apreensões de drogas pelas forças de segurança teve aumento de 188%. Entre janeiro e abril de 2019, a Brigada Militar e a Polícia Civil recolheram 2,97 toneladas de drogas somando maconha, cocaína e crack. No mesmo período deste ano, o total de apreensões se multiplicou para 8,57 toneladas.

Esse grande prejuízo econômico, além de acertos de contas por dívidas ligadas à responsabilização pela perda do material apreendido, acirra disputas por novos pontos de tráfico, o que leva a assassinatos entre grupos rivais. O monitoramento de dados realizado pelo corpo técnico da Gestão de Estatística em Segurança (GESEG), ligado ao programa RS Seguro, aponta que mais de 80% dos homicídios registrados no Estado têm alguma relação com disputas e desavenças inseridas no contexto do tráfico de drogas.

Homicídios de detentos soltos representam 8,4% do total em maio

Além do encolhimento no comércio ilegal de drogas, levantamento do Departamento de Inteligência da Segurança Pública (Disp) da SSP aponta que contribuiu para o aumento no número de homicídios a soltura de criminosos que estavam presos. As libertações ocorrem durante a vigência da recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça, que “recomenda aos tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19) no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo”.

Somados os meses de março, abril e maio, o número de detentos beneficiados com concessões de liberdade aumentou de 10.112 no ano passado para 15.334 neste ano. A saída de criminosos, muitas vezes, mobiliza rivalidades entre grupos, abre disputas na hierarquia dos bandos e desencadeia ataques encomendados para acerto de contas.

Entre as 154 vítimas de homicídio no RS em maio, 13 eram indivíduos que estavam presos e ganharam liberdade, o que representa 8,4% do total de assassinatos no Estado. Caso essas mortes não tivessem ocorrido, o número de homicídios no mês teria sido de 141, o que representaria queda de 2,8% sobre os 145 registrados em maio do ano passado.

Desde a chegada da pandemia no Rio Grande do Sul, em março, até o final de maio, 40 presos que ganharam liberdade foram assassinados. O número representa alta de 90% sobre os 21 presos que tiveram liberdade concedida e foram mortos no mesmo período do ano anterior.

Foto: Divulgação | Fonte: Assessoria

 

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