Embora não seja um movimento novo, a transformação digital foi acelerada durante a pandemia do novo Coronavírus. A leitura é que trata-se de um movimento sem volta. Pesquisa da consultoria BCG com 200 empresas globais aponta que 61% das respondentes admitem ter acelerado o processo de transformação digital ao longo do ano passado, enquanto 96% dessas esperam acelerar a execução de projetos relacionados à área nos próximos 24 meses. No setor calçadista, a realidade não é diferente. Mais tímidos nos anos pré-pandemia, os processos de transformação digital ganharam força ao longo do ano passado e chegaram para ficar.
O presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, avalia que o movimento vem ganhando força na atividade. “Anos atrás, a produção de calçados era muito mais artesanal do que é hoje. Empresas estão investindo, cada vez mais, não somente em ações de comunicação nas redes sociais, mas também na digitalização do processo produtivo, visando melhores condições de competitividade”, ressalta.
Não são poucos os cases de diferentes empresas do setor calçadista que corroboram o movimento de transformação digital.
Confira alguns deles
Grendene foca em tecnologia
A inovação sempre acompanhou a Grendene, tanto que a primeira loja virtual de calçados do Brasil foi da marca
Melissa, em 2001. Com 50 anos completos em 2021, a calçadista gaúcha, de Farroupilha/RS, tem a transformação digital como um dos focos do negócio. Movimento que está estruturado no tripé negócios, tecnologia e cultura. O diretor da Operação Melissa e de Negócios Digitais na Grendene S/A, Paulo Antonio Pedó, conta que todas as operações de e-commerce da empresa foram internalizadas. “Concluímos esse processo em fevereiro deste ano. A ideia inicial era concluir em dois anos, mas aceleramos e fizemos em dez meses”, conta, ao dizer que as vendas aumentaram muito no digital.
“Temos um processo de inovação interno com pessoas alocadas exclusivamente para esse projeto”
O grande destaque no processo de transformação digital da Grendene está no pilar de tecnologia, no qual a empresa mantém um projeto voltado à inovação: o Bergamotta Labs. Lançado em fevereiro de 2020, o projeto é um sistema com três laboratórios que aproxima a Grendene do ecossistema de startups e de inovação aberta. “Temos um processo de inovação interno com pessoas alocadas exclusivamente para esse projeto”, conta Pedó, ao dizer que dos três laboratórios, um é voltado para novas formas de acessar o consumidor; outro para a produção; e um terceiro para o desenvolvimento de soluções e produtos. Alguns desses projetos que nasceram no Bergamotta Labs já estão no ar, como a Nuar, que vai além da sandália vegana, 100% reciclável, com 38% de materiais reciclados pré-consumo e 10% de fontes renováveis, como óleos vegetais e casca de arroz. A Nuar é uma marca e uma plataforma digital em busca do melhor impacto para as pessoas, planeta e animais.
Considerado por Pedó o principal do tripé, o pilar da cultura é multiplicado internamente por meio da Universidade Grendene. Atualmente, a empresa tem mais de 200 colaboradores das mais variadas áreas como facilitadores digitais. Eles passaram por um processo de capacitação e, agora, disseminam a cultura digital na Grendene. E toda essa transformação digital que vem sendo desenvolvida pela calçadista está aliada ao processo produtivo que há mais de seis anos trabalha com robôs e automação industrial.
Jorge Bischoff acelerou o processo de transformação digital
Desde 2017 em processo de transformação digital, o Bischoff Group, de Igrejinha/RS, vê a aceleração desse
movimento como uma herança da pandemia. “A transformação digital é trabalhada na cultura da empresa, com o engajamento dos nossos funcionários”, ressalta Adriane Lopes dos Santos, diretora de Gestão de Franquias e líder do Programa de Transformação Digital do Bischoff Group. Segundo ela, nesse último ano, a empresa não somente aumentou os investimentos no seu e-commerce como também dinamizou o relacionamento com lojistas de todo o Brasil, em especial com as 83 lojas Jorge Bischoff franqueadas.
“A transformação digital é trabalhada na cultura da empresa, com o engajamento dos nossos funcionários”
“Estivemos longe, mas muito mais presentes no dia a dia das lojas. Para o consumidor, em março do ano passado criamos a Prateleira Infinita, permitindo que ele compre on-line e receba na loja física, onde pode ter uma experiência diferenciada”, conta Adriane. Além da Prateleira Infinita, que teve papel fundamental na manutenção das vendas durante as restrições sanitárias, a empresa criou formas de ajudar os vendedores durante o fechamento do comércio. A “Minha Jorge Bischoff” permitiu que, com um código, os vendedores cadastrados pudessem comercializar produtos Jorge Bischoff, via e-commerce, recebendo comissão.
A área de Desenvolvimento de Produto do Grupo também contou com transformações importantes. Adriane lembra que, em agosto de 2020, o Bischoff Group adotou uma nova plataforma de trabalho que visa a integração total entre a sua rede de negócios: empresa, seus parceiros industriais, lojas e Centro de Distribuição. “Desde a criação dos produtos (incluindo seu detalhamento técnico) até a logística e a venda, a utilização de um único sistema compartilha dados fundamentais entre os elos da cadeia produtiva-varejista. O objetivo é agilizar e otimizar o fluxo de processos, minimizando o conflito de informações e trazendo ganho de tempo e maior controle”, avalia a gestora, ressaltando que o processo está em andamento.
Luz da Lua buscou consultoria especializada
Há cerca de um ano, o movimento da transformação digital faz parte do dia a dia da Luz da Lua, de Novo
Hamburgo/RS. A calçadista, que conta com cerca de mil funcionários, criou em junho de 2020 um comitê para discutir a digitalização da empresa. E desde então, vem avançando a passos consistentes e seguros neste processo. O diretor comercial da marca, Eduardo Smaniotto, conta que várias iniciativas em diversas frentes foram criadas. “Contratamos uma consultoria externa para mapear todos os nossos processos. Em tempos de margens e resultados escassos, o resultado vem do aumento de eficiência e otimização de processos. Então, embora não seja digital, o primeiro passo foi a análise dos parceiros”, destaca, ao contar que a consultoria segue sendo realizada.
“Em tempos de margens e resultados escassos, o resultado vem do aumento de eficiência e otimização de processos.”
Atualmente, a consultoria está na fase de levantamento de requisitos da área industrial. Smaniotto frisa que a empresa utiliza o que há de mais tecnológico, mas o que ainda precisa de ajustes será feito após a entrega desta etapa. “Estamos em fase de conclusão de mais ajustes na unidade produtiva e queremos ter em breve mais notícias.”
Outro ponto importante do processo de transformação digital da Luz da Lua está relacionado à comunicação digital. No final de 2019, a calçadista mudou sua plataforma de e-commerce e implementou uma série de melhorias que possibilitaram uma conexão maior das lojas físicas com a plataforma. “Dessa forma, as vendedoras podiam fazer vendas por meio do site e serem remuneradas. Algumas lojas físicas, inclusive, conseguiram bater suas metas a partir dessa novidade que possibilitou a realização de vendas on-line para as lojas físicas”, salienta Smaniotto.
Outro movimento forte tem sido a realização de lives de lançamento das coleções. “Temos feito nossas convenções totalmente digitais e divididas entre os nossos canais de atuação. Agora, por exemplo, conseguimos chegar aos clientes multimarcas de forma mais próxima e passar as informações que desejamos”, afirma Smaniotto, ao frisar que a venda continua sendo presencial.


